A Coreia do Sul não é só K-pop e doramas. Existe uma força pulsante na literatura sul-coreana que tem conquistado o mundo em silêncio. Eu me peguei imerso em histórias que, ao mesmo tempo que falam de um lugar tão distante, tocam diretamente nas minhas feridas mais íntimas.
Autores como Han Kang e Kim Young-ha estão mostrando ao Ocidente que a alma coreana vai muito além dos estereótipos. É densa, sombria, poética — e extremamente atual.
Você já se permitiu sentir isso?
O que torna esses livros tão diferentes?
A literatura sul-coreana não tem pudor. Ela não tenta suavizar o incômodo. Pelo contrário: abraça a dor, a violência, o trauma — e tudo isso com uma escrita afiada e sensível.
Me impressiona como esses autores não têm medo de desnudar o humano. De colocar na mesa o que muita literatura ocidental esconde.
Eles escrevem com o sangue da história recente do país. Guerra, ditadura, suicídio, desigualdade — nada é tabu. Mas tudo isso é tratado com uma delicadeza quase cinematográfica.
Quais são os 15 livros que você precisa ler?
Prepare-se. Esses títulos não são apenas livros. São experiências.
1. A Vegetariana – Han Kang
Esse livro me destruiu. Uma mulher que decide parar de comer carne — e isso desencadeia uma espiral de loucura. Não é sobre dieta. É sobre controle, corpo e liberdade.
2. Atos Humanos – Han Kang
Sim, ela de novo. Aqui, Han Kang revive o Massacre de Gwangju. A brutalidade é quase insuportável — mas necessária.
3. Por Favor, Cuide da Mamãe – Shin Kyung-sook
Esse livro me fez chorar. De verdade. Uma mãe desaparece, e a família precisa encarar tudo que ignorou sobre ela.
4. Eu Tenho o Direito de Me Destruir – Kim Young-ha
Só pelo título já dá pra sentir o peso. Um narrador que convence pessoas a cometer suicídio. Filosofia, arte, niilismo puro.
5. A Boa Filha – You-Jeong Jeong
Thriller psicológico de primeira. Uma jovem acorda ao lado do corpo morto da mãe. E ela pode ou não ser a assassina.
6. A Biblioteca da Meia-Noite de Seul – Ha Seong-nan
Contos curtos, mas com impacto devastador. Críticas sociais escondidas em narrativas sutis.
7. Alma – Choi In-hun
Um romance político raro, escrito durante os anos 60. Obra monumental sobre identidade e exílio.
8. O Estrangeiro em Mim – Hwang Sok-yong
Um veterano da Guerra do Vietnã retorna para uma Coreia irreconhecível. Retrato de um país fragmentado.
9. Um Bom Lugar para Morar – Kim Ae-ran
Narrativas urbanas com jovens solitários tentando sobreviver. Quase uma pintura da vida em Seul.
10. Diário de um Assassino – Kim Young-ha
Um serial killer com Alzheimer decide cometer um último assassinato. Tensão do início ao fim.
11. A Canção de Chungsan – Yi Sang
Poesia surrealista da década de 1930. Complexo, simbólico, absolutamente original.
12. A Voz da Mulher – Kim Soom
Mulheres que sobreviveram à escravidão sexual durante a ocupação japonesa. Um grito histórico.
13. O Som da Minha Voz – Yi Mun-yol
Reflexão sobre moralidade, fé e traição. Um dos romances mais filosóficos da lista.
14. Quando a Noite se Torna Infinita – Pyun Hye-young
Distopia claustrofóbica. O mundo urbano como uma prisão invisível.
15. O Desaparecimento de Josef Mengele – Seo Mi-ae
Sim, o título é esse. E sim, mistura fatos históricos com thriller psicológico. Genial e ousado.
Esses livros estão sendo traduzidos?
Sim! Cada vez mais editoras ocidentais estão apostando na tradução da literatura sul-coreana. Autores como Han Kang e Kim Young-ha já têm diversas obras publicadas em português.
E isso é só o começo. Há uma onda vindo. E eu recomendo estar dentro dela.
E se você nunca leu nada da Coreia?
Comece. Hoje. Escolha um título da lista. Leia com o coração aberto. Vai ser estranho no início. Talvez até desconfortável.
Mas depois, algo muda.
A literatura sul-coreana não te dá respostas. Ela planta perguntas que ficam ecoando por dias.
E sinceramente? Isso vale mais do que qualquer final feliz.
Onde encontrar essas obras no Brasil?
Confesso que, no começo, tive dificuldade em encontrar muitos desses livros. Mas nos últimos anos, editoras como a Todavia, Companhia das Letras, Estação Liberdade e Moinhos começaram a publicar traduções de alta qualidade.
A Amazon também é uma aliada forte — muitos desses títulos estão disponíveis em e-book, o que facilita demais o acesso. Alguns, inclusive, estão no Kindle Unlimited.
Se você gosta de garimpar, dê uma olhada em sebos virtuais. Já encontrei exemplares esgotados por preços surpreendentes.
E fica a dica: algumas livrarias coreanas, como a Kyobo ou Yes24, entregam internacionalmente. Se você lê em inglês, isso abre um universo.
Por que esses livros são tão humanos?
O que me fascina na literatura sul-coreana é que ela parece escrita com o coração exposto.
Os personagens são falhos. Não há heróis perfeitos. Há pessoas comuns tentando resistir, sobreviver, encontrar sentido.
A dor nunca é gratuita — ela tem contexto. Ela carrega o peso de uma sociedade marcada por guerras, ocupações, ditaduras e uma modernidade acelerada.
Ler esses livros é como ouvir alguém sussurrar uma verdade que ninguém mais teve coragem de dizer.
Quem são os autores que ainda vamos ouvir muito falar?
Além dos nomes que já mencionei, fique de olho em:
Bae Suah – Experimental, intensa, quase alucinógena.
Cho Nam-joo – Autora de Kim Jiyoung, Nascida em 1982, um manifesto feminista que explodiu no mundo todo.
Jeong Yu-jeong – Comparada a Stephen King. Sim, ela é boa assim.
Hwang Jungeun – Suas narrativas tratam de violência urbana e marginalidade de forma delicada.
Kang Hwa-gil – Nova geração, com pegada realista e crítica.
Esses nomes vão crescer. Aposte neles agora, e você será aquela pessoa que “já conhecia antes de todo mundo”.
A literatura sul-coreana é só pra quem gosta de drama?
Definitivamente não. Se você curte suspense, terror, ficção científica, romance, distopia ou até mesmo contos filosóficos — tem algo pra você.
A diversidade de gêneros é enorme. Mas o que une tudo é o estilo direto, visceral e emocional.
Mesmo nos livros de suspense, como Diário de um Assassino, há espaço pra reflexão existencial.
Mesmo nas obras de ficção científica, como as de Pyun Hye-young, há crítica social afiadíssima.
Ou seja: se você gosta de literatura que não subestima sua inteligência — chegou ao lugar certo.
Qual o impacto de ler essas histórias hoje?
Em um mundo saturado de narrativas eurocêntricas, a literatura sul-coreana oferece uma nova lente.
Ela me ensinou que o Oriente também pensa — e pensa muito. E que o sofrimento de lá não é tão diferente do daqui.
Mais do que entretenimento, esses livros são pontes. Entre culturas. Entre experiências humanas. Entre passados traumáticos e futuros incertos.
Eles me transformaram. E, se você se permitir, podem transformar você também.